Uso de PrEP cresce no Ceará, mas medicação de prevenção ao HIV esbarra em desinformação e distribuição limitada

  • 01/12/2024
(Foto: Reprodução)
Apenas 11% dos municípios cearenses distribuem o medicamento preventivo contra o HIV. Uso de Prep no Ceará cresce, mas medicação esbarra em desinformação e distribuição centralizada. Ministério da Saúde A distribuição de Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) cresceu significativamente no Ceará desde 2018 — ano em que a medicação passou a ser distribuída no Sistema Único de Saúde (Sus) —, mas o acesso da população ao medicamento preventivo contra o HIV ainda esbarra em desinformação e em distribuição centralizada. Neste domingo, 1º de dezembro, é marcado o Dia Mundial de Combate à Aids. Conforme o Ministério da Saúde, a prevenção com PrEP consiste na tomada de comprimidos antes da relação sexual, que permitem ao organismo estar preparado para enfrentar um possível contato com o HIV, vírus causador da Aids. A pessoa em PrEP realiza acompanhamento regular de saúde, com testagem para o HIV e outras Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST). 🌐 No Ceará, apenas 11,41% dos municípios possuem unidades onde é possível receber a Prep. O número representa 21 das 184 cidades do estado. A capital Fortaleza é um dos municípios da lista. Uma das nove unidades de saúde onde é possível receber a PrEP é a Policlínica Dr. Luiz Carlos Fontenele, no bairro Passaré. É lá onde o advogado Ornan Júnior recebe a medicação há cerca de seis anos. Ornan Júnior fala porquê decidiu começar a tomar a Prep, em Fortaleza. “Eu comecei a tomar em virtude do meu relacionamento, que não era monogâmico. E aí nós pensamos que seria conveniente ambos fazerem a PrEP como algo a mais. E aí foi quando ele [ex-namorado] procurou primeiro, começou a fazer, e depois eu também fui atrás, depois de alguns meses”, explicou Ornan. À época, inclusive, ele revelou ter encontrado dificuldade em achar um local onde conseguisse receber a PrEP; precisou passar por três unidades até conseguir marcar na Policlínica do Passaré. “Alguém me disse que uma policlínica, que tinha acabado de abrir, próximo ao Castelão, que tinha vaga lá porque tinha acabado de abrir. Tentei ligar, não consegui. Daí, fui até lá, e disseram que de fato tinha. Aí agendaram um dia para eu voltar e começar o procedimento, o acompanhamento”, relembrou. “Então teve uma pequena saga, tanto online quanto física, para poder encontrar o local que estivesse disponibilizando, que estivesse com vaga. Mas a informação, no geral, quanto a PrEP e o fato dela ser disponibilizada pelo SUS, foi fácil”, complementou Ornan. Ao longo dos últimos seis anos, Ornan disse ter notado que o acesso à PrEP ficou mais fácil. No entanto, ele acredita que a desinformação ainda pode ser vilã no processo de tomar a medicação preventiva. “Quando eu indico pra alguém, e depois eu recebo algum feedback, eu noto que hoje está mais simples, como se talvez as equipes tenham aumentado, os locais tenham aumentado, e o procedimento também tá menos burocrático”, reforçou o advogado. Ornan Júnior, advogado, toma Prep há cerca de seis anos. Ismael Soares/SVM O que é a PrEP? O Ministério da Saúde explicou que a PrEP é a combinação de dois medicamentos (tenofovir + entricitabina) que bloqueiam alguns “caminhos” que o HIV usa para infectar o organismo. Existem duas modalidades de PrEP indicadas: PrEP diária: consiste na tomada diária dos comprimidos, de forma contínua, indicada para qualquer pessoa em situação de vulnerabilidade ao HIV PrEP sob demanda: consiste na tomada da PrEP somente quando a pessoa tiver uma possível exposição de risco ao HIV. Deve ser utilizada com a tomada de 2 comprimidos de 2 a 24 horas antes da relação sexual, mais 1 comprimido 24 horas após a dose inicial de dois comprimidos, e mais 1 comprimido 24 horas após a segunda dose. A PrEP sob demanda é indicada para pessoas que tenham habitualmente relação sexual com frequência menor do que duas vezes por semana e que consigam planejar quando a relação sexual irá ocorrer. Além disso, as evidências científicas garantem a segurança e eficácia da PrEP sob demanda somente para algumas populações. São elas: Homens cisgêneros heterossexuais, bissexuais, gays e outros homens cisgêneros que fazem sexo com homens (HSH) Pessoas não binárias designadas como do sexo masculino ao nascer Travestis e mulheres transexuais - que não estejam em uso de hormônios à base de estradiol. Uso da PrEP Lara Távora, diretora clínica do Hospital São José, unidade referência em infectologia, explicou que o uso da PrEP não é obrigatoriamente para a vida toda, mas enquanto a pessoa avalie que está tendo exposição de risco. “Vamos supor que a pessoa consiga mudar a vida, passe a ter um parceiro fixo e há fidelidade no casal. Nessa situação, se o meu parceiro é, sabidamente, soronegativo, não precisa mais o uso da PrEP”, explicou. “No entanto, se lá na frente, ela se vê de novo em situação de risco e quiser voltar a tomar a PrEP, ela não pode simplesmente começar a tomar, vamos supor, o resto de comprimido que ficou em casa. Ela precisa novamente buscar um atendimento para que ela seja testada, garantir que ela não está infectada, para que ela volte a tomar medicação”, complementou a infectologista. O uso, inclusive, é indicado pelo Ministério da Saúde a quem: Frequentemente deixa de usar camisinha em suas relações sexuais (anais ou vaginais); Faz uso repetido de PEP (Profilaxia Pós-Exposição ao HIV); Apresenta histórico de episódios de Infecções Sexualmente Transmissíveis; Contextos de relações sexuais em troca de dinheiro, objetos de valor, drogas, moradia, etc. Chemsex: prática sexual sob a influência de drogas psicoativas (metanfetaminas, Gama-hidroxibutirato (GHB), MDMA, cocaína, poppers). Cenário da Aids no Ceará 📶 De 2014 a outubro de 2023, 9.783 pessoas foram diagnosticadas com HIV no Ceará, de acordo com o Boletim Epidemiológico de HIV, da Secretaria da Saúde do Estado (Sesa). 🚹🚺Dos diagnosticados, 7.416 (75,8%) eram do sexo masculino e 2.367 (24,2%) do sexo feminino. 🔴 A maior concentração dos casos de Aids nesse período, conforme o levantamento, foi observada nos indivíduos com idade entre 30 a 39 anos, seguidos dos de 40 a 49 anos. ⚫ Já em relação aos óbitos, foram registrados no Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) 3.377 óbitos no estado tendo o HIV/aids como causa básica. Com uma média de 330 mortes por ano. 📍 Fortaleza teve a maior incidência de mortes do período, com 2.374 registros (70,3%), seguida da região Norte, com 400 óbitos (11,9%). Descentralização da distribuição Municípios cearenses que distribuem PrEP e quantidade entregue por ano. Louise Anne Dutra/SVM Em seis anos, o Ceará saltou de três para 21 municípios com distribuição de PrEP (conforme dados da Secretaria da Saúde do Ceará e do MinS). Apesar do crescimento, é necessário ampliar os locais onde a prevenção pode ser recebida — além de combater a desinformação envolta do medicamento. Em nota, a Sesa informou que “a ampliação desses serviços está em fase de planejamento, com o objetivo de garantir maior acesso à profilaxia para a população, especialmente em regiões que ainda não contam com unidades de dispensação”. A infectologista Lara Távora avaliou que é preciso se espelhar em estratégias adotadas fora do estado, como a cidade de São Paulo, onde houve 82.678 dispensações da prevenção em 2024 — até 31 de outubro. “São Paulo está renovando a forma de pensar a PrEP. Está colocando postos para avaliação e prescrição de PrEP nas estações de metrô, colocando máquinas de dispensação de PrEP, desde que o paciente tenha receita, com QRCode, tudo certinho” “Também em locais de acessibilidade, estações de metrô, estações de ônibus. Fazendo com que a PrEP chegue ao usuário. Não ficar esperando que o usuário venha à unidade de saúde em busca de PrEP. Então, essa foi a grande sacada de São Paulo”, complementou. Ela disse ainda que, em Fortaleza, a medicação já está sendo distribuída em alguns postos de saúde, o que pode facilitar o acesso. “A PrEP, ela estava muito nos centros especializados de atendimento a pessoas vivendo com HIV/Aids. E isso limitava muito, porque, além de ter horários específicos de funcionamento, estarem sempre muito lotados, porque fazem atendimento à pessoa já portadora do vírus. Ainda tinha a questão do preconceito, do medo que a pessoa tinha de ir a um local desse”, destacou Távora. Acolhimento Mesmo após mais de 40 anos desde a notificação do primeiro caso de Aids no Brasil, os pacientes ainda esbarram em problemas como preconceito e falta de informações. Foi em busca de acolher esse público e de disseminar informações para evitar novos casos, que surgiu em 1993, na capital cearense, a Associação de Voluntários do Hospital São José (AVHSJ), que atende mais de 2 mil pessoas por ano. “Algumas pessoas faziam um trabalho voluntário lá dentro do hospital [São José] de acolhimento, suporte emocional para as pessoas que vivem com HIV e que naquela época eram bem mais estigmatizadas. Desse movimento, surgiu a proposta de criar a associação”, disse a assistente social Talita de Lemos Araújo, que é coordenadora de um dos projetos da entidade. AVHSJ possui uma equipe transdisciplinar formada por assistente social, psicólogo, professores, entre outros profissionais. No local são desenvolvidas oficinas, rodas de conversa, cineclube e acompanhamento psicológico tanto para portadores de HIV, como para o público em geral. Entre essas atividades, está a divulgação e tira-dúvidas sobre o uso da PrEP e da PEP — tratamento para as pessoas que tenham contato com o vírus. “A gente trabalha a prevenção combinada, conversa, tira as dúvidas. Porque às vezes eles [portadores de HIV] levam os parceiros e as parceiras e é como se fosse para a gente validar a informação que eles estão dando. Com isso, a gente aborda as estratégias de prevenção, conversa sobre PrEP, sobre PEP e a importância das testagens regulares, para evitar novos casos”, explicou Talita Araújo. Assista aos vídeos mais vistos do Ceará

FONTE: https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2024/12/01/uso-de-prep-cresce-no-ceara-mas-medicacao-de-prevencao-ao-hiv-esbarra-em-desinformacao-e-distribuicao-limitada.ghtml


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